VAMOS REFLETIR COM LUIZ CLÁUDIO GAMA - TEMA: "O RISCO DE INFANTILIZAR A GESTÃO PÚBLICA"





Na última sexta feira o TCE-RJ aplicou prova de seleção para ingresso na Pós Graduação em Gestão Pública Municipal. Na prova de Português um texto pra lá de interessante sobre os órgãos de controle e as administrações públicas. Destaquei um trecho do texto para aguçar a curiosidade de quem gosta de ler. 

“Agências reguladoras e gestores públicos em geral têm evitado tomar decisões inovadoras por receio de terem atos questionados. Ou pior: deixam de decidir questões simples.”


O risco de ‘infantilizar’ a gestão pública


O controle da administração pública passou por profunda transformação nos últimos 30 anos, impulsionado pela configuração institucional da Constituição de 88, que em boa hora fortaleceu órgãos como o MP e o TCU. Deve haver, porém, equilíbrio entre gestão e seu controle, sob pena de criarmos no país um “apagão decisório”, despertando nos gestores temor semelhante ao de crianças inseguras educadas por pais opressores.


A Emenda Constitucional 19 lançou bases para uma administração gerencial, mitigando o modelo burocrático, de matriz weberiana, instituído em 1988. Aos novos instrumentos que propugnam uma gestão voltada para resultados, deve corresponder um controle de mesma índole.


A busca da eficiência, todavia, não pode significar o afrouxamento do controle de legalidade e o combate à improbidade deve prosseguir com rigor. A transição de modelos, contudo, tem sido tormentosa tanto para o gestor, quanto para o controlador. Num quadro pavoroso de corrupção, o risco que se corre é o da generalização indevida, e é preciso responsabilidade para resistir a esse impulso.


O controle de legalidade possui contornos bem definidos, já o de eficiência é menos preciso e mais subjetivo. Exatamente por isso a hipertrofia e o voluntarismo devem ser repelidos nos órgãos de controle, pois não possuem legitimação democrática para formular políticas públicas. O controlador da administração gerencial deve agir com autocontenção e noção de consequencialismo.


Richard Posner caracteriza o consequencialismo pela necessidade de se observar os impactos econômicos das decisões estatais, tendo em vista que a maximização de riqueza incrementa o bem-estar das pessoas, e esse é o objetivo de qualquer nação. É comum decisões bem-intencionadas causarem resultados desastrosos. Segundo Posner, decisões assim são intrinsecamente erradas.


Se, do ponto de vista administrativo, uma política pública que consome dezenas ou centenas de bilhões de reais do orçamento e não resulta em benefícios para a população é tão condenável quanto uma licitação fraudada ou um contrato superfaturado, que ferramentas órgãos de controle têm para medir e controlar a eficiência dessa ação de governo?


O TCU tem se esmerado em realizar auditorias operacionais que identificam fragilidades, riscos e oportunidades de aperfeiçoamento na gestão governamental. Justamente por navegar nos mares da eficiência, e não no controle estrito da legalidade, é preciso resistir à tentação de substituir o gestor público nas escolhas que cabem ao Poder Executivo, e é essa a autocontenção que defendo.


É comum que especialistas — como são os auditores — tenham concepções e fórmulas até mais inteligentes para os problemas identificados, mas o controle de eficiência deve mirar processos de tomada de decisão e a razoabilidade dos critérios adotados, sem pretensões quixotescas ou salvacionistas.


A hipertrofia do controle gera a infantilização da gestão pública. Agências reguladoras e gestores públicos em geral têm evitado tomar decisões inovadoras por receio de terem atos questionados. Ou pior: deixam de decidir questões simples à espera de aval prévio do TCU. Para remediar isso, é preciso introduzir uma dose de consequencialismo.


Em correspondência recente, fui relembrado pelo Prof. Adilson Dallari (PUC-SP) daquilo que o jurista argentino Roberto Dromi apelidou de código do fracasso na administração pública: “Art. 1º: não pode; Art. 2º: em caso de dúvida, abstenha-se; Art. 3º: se é urgente, espere; Art. 4º: sempre é mais prudente não fazer nada”. O Brasil precisa revogar esse código urgentemente.


Bruno Dantas é ministro do TCU, pós-doutor em Direito (Uerj), professor do mestrado da UNINOVE e do IDP, e Visiting Research Fellow na Cardozo School of Law (Nova York) e no Max Planck Institute Luxembourg for Regulatory Procedural Law.




************



Com informações da assessoria de Luiz Cláudio Gama. 

Comentários

VEJA AS DEZ POSTAGENS MAIS VISITADAS NOS ÚLTIMOS 7 (SETE), DIAS