CULTURA - ACABOU CHORARE: 40 ANOS DEPOIS, UMA VIAGEM AO PRESENTE


Os novos baianos
Os Novos Baianos; em primeiro plano, Baby Consuelo


Gravado em 1972, Acabou Chorare é um dos discos mais influentes da história da música brasileira. Para lembrar e homenagear o álbum, que completou 40 anos em 2012, Moraes Moreira se apresentou no Opinião, Porto Alegre, em 25 de abril. No show, apresentou todo o disco, em seus arranjos originais.

Por Marcelo Delacroix


No princípio era uma banda de rock. Jovens, baianos, hippies, cabeludos, influenciados pelas guitarras pesadas de Jimi Hendrix, o canto rasgado de Janis Joplin e toda aquela cena musical pós-Woodstock que havia chegado com força no Brasil, na virada dos 70.


Mas quando Os Novos Baianos gravaram o disco Acabou Chorare (1972), eles já traziam na bagagem as experiências de um primeiro disco anterior, É Ferro na Boneca (1970), e a célebre visita de João Gilberto, que apareceu de terno e gravata no apto em que viviam (todos juntos!) no Rio, e fez com que as coisas mudassem de rumo, para o grupo e para a música brasileira. Nesse encontro João apresentou ao grupo a música Brasil Pandeiro, samba clássico de Assis Valente (“Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor”), descortinando diante deles todo o mundo do samba e da música brasileira, e falando da necessidade de “se voltarem para dentro de si mesmos”, num resgate das origens. “E fez-se a luz”!

Já vivendo num sítio em Jacarepaguá, passaram quase dois anos preparando o disco que recentemente foi o mais votado na lista dos 100 Maiores Discos da Música Brasileira, elaborada pela revista Rolling Stone Brasil em 2007, contando os votos de 60 críticos especializados. Após uma tentativa frustrada de gravação num estúdio, eles conseguiram fazer com que a gravadora Som Livre (na época dirigida pelo pai do Cazuza) aceitasse gravá-lo lá mesmo, no sítio onde moravam em comunidade, ensaiando dia e noite, respirando e se alimentando de música, paz (maconha) e amor. Eram apenas 4 canais e nenhum dos recursos modernos de edição e afinação. E não precisava!

O disco chegou rompendo definitivamente a barreira que separava o Rock e a Música Brasileira (numa época em que houve até passeata contra a guitarra elétrica, protagonizada por Gilberto Gil e Elis Regina), misturando violão, cavaquinho e pandeiro com as guitarras do rock e do trio elétrico; tocando ritmos brasileiros como samba, choro e baião, com a energia e a “pegada” do rock. Isso já era coisa que vinha aparecendo aqui ou ali, em Mutantes, Caetano, Gil e Tom Zé, mas pela primeira vez um grupo assumia essa sonoridade num disco inteiro, com uma unidade de proposta.

Além disso, fica evidente uma alegria e alto astral absolutamente incomuns na música brasileira daquela época que, ou chorava mágoas de amores sofridos por um lado, ou fazia discursos políticos engajados contra a ditadura, por outro, num cenário muito cinza.

Além de Brasil Pandeiro, o disco apresenta oito parcerias de Moraes Moreira com Galvão, Pepeu Gomes e Paulinho Boca de Cantor, incluindo sucessos como Preta Pretinha (‘’abre a porta e a janela e vem ver o sol nascer”), o rock-baião Tinindo trincando, a impagável Besta é tu, e a super pop A menina dança. E é claro, Acabou Chorare, que dá nome ao disco, composta em homenagem à filhinha de João Gilberto com Miúcha, Bebel Gilberto, e onde aparecem ainda mais evidentes toda a influência de João na música dos Novos Baianos, na harmonia da bossa nova e a maneira de cantar.

Numa aparente simplicidade que mal esconde a riqueza enorme de informações, na batida diferente e nas divisões rítmicas do violão de Moraes Moreira, nas vozes afinadas e ágeis de Baby Consuelo e seus colegas Moraes Moreira e Paulinho Boca de Cantor, alicerçados num power trio fortíssimo com Pepeu Gomes na guitarra e violões, Dadi Carvalho (A cor do Som, Tribalistas, Marisa Monte) no baixo, e as baterias e percussões de Baixinho e Jorginho Gomes (irmão de Pepeu), Acabou Chorare segue absolutamente atemporal, mais atual do que nunca, completamente de acordo com a sonoridade e a filosofia das produções atuais, que têm priorizado a coletividade, a espontaneidade e o clima do “ao vivo”, 40 anos depois.Acabou Chorare é uma viagem ao Presente

Fonte: Sul 21

Comentários

VEJA AS DEZ POSTAGENS MAIS VISITADAS NOS ÚLTIMOS 7 (SETE), DIAS