O CESSAR-FOGO UNILATERAL DA FARC DIVIDE AS OPINIÕES NAS CONVERSAÇÕES DE PAZ NA CIDADE DE HAVANA EM CUBA


Farc / AFP
Iván Márquez, das Farc, anunciou trégua unilateral até janeiro de 2013


O cessar-fogo unilateral anunciado nesta segunda-feira pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) gerou reações antagônicas no país sul-americano.
Para marcar o início das conversações de paz em Havana, em Cuba, o negociador-chefe das Farc, Iván Márquez, ordenou aos guerrilheiros "o fim de todos os tipos de operações militares ofensivas contra as forças de segurança e os atos de sabotagem contra as infraestruturas privada ou pública, durante o período entre a meia-noite do dia 20 de novembro de 2012 até a meia-noite do dia 20 de janeiro de 2013".
Se uns consideram o gesto um incentivo ao processo de paz e cobram uma iniciativa semelhante do governo colombiano, outros pedem cautela. Houve até quem achasse que o armistício temporário era, na verdade, uma armadilha.
No entanto, o ministro da Defesa da Colômbia, Juan Carlos Pinzón, disse nesta segunda-feira que as forças de segurança do país vão manter suas operações militares, apesar da trégua unilateral das Farc.
Para entender o impacto desse cessar-fogo temporário nas negociações de paz e no futuro das Farc, a BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, conversou com dois especialistas com visões diametralmente opostos. Confira clicando nas abas abaixo.
BBC Mundo: Qual a importância do cessar-fogo anunciado pelas FARC?
Valencia: Achei um gesto ousado, mas importante, pois dá maior credibilidade às negociações de paz. A iniciativa já foi usada em outros processos de paz: a Frente de Libertação Nacional de El Salvador, em um momento de muitas dúvidas no país, também lançou mão de um gesto parecido. O grupo determinou um cessar-fogo unilateral para enviar uma mensagem de tranquilidade à sociedade salvadorenha, o que foi muito bem recebido. Eu espero que ocorra o mesmo na Colômbia.
Espero também que as Farc tenham controle suficiente sobre suas tropas - e acredito nisso - para transformar tal iniciativa em algo verdadeiro e sincero. Pois a partir daí o processo avança para uma competição de gestos positivos. Isso é muito importante em um processo de paz porque um gesto positivo normalmente gera outro igualmente positivo.
BBC Mundo: E o que seria um gesto positivo por parte do governo? O presidente colombiano (Juan Manuel Santos) também poderia pedir um cessar-fogo do lado dos militares?
Valencia: Acho essa hipótese pouco provável, pois uma decisão como essa está cercada de muitas pressões. De um lado, há as forças armadas, que têm insistido em manter o confronto e descartam qualquer negociação com as Farc. De outro, a ala partidária de direita representada pela figura do presidente, que tampouco quer o fim das ações ofensivas. Por exemplo: ao retribuir o gesto tomado pelas Farc, o governo daria um tiro político no próprio pé. A administração de Santos teme que, ao trabalhar com uma iniciativa semelhante à do grupo guerrilheiro, provoque um mau-estar nas Forças Armadas e na ultra-direita que a apóia.
BBC Mundo: Esta não é a primeira trégua anunciada pelas Farc. O que há de tão diferente agora? A duração? O momento?
Valencia: O momento. Especialmente porque as Farc controlam muitas áreas do país. Nesse sentido, a proximidade do Natal é uma ocasião perfeita. Em primeiro lugar, com a iniciativa, as Farc passam uma mensagem positiva para o público. Em segundo, ganham tempo para engrossar suas fileiras, pois os militares tendem a depor as armas durante as festividades do fim do ano.
BBC Mundo: Mas se as Farc não respeitarem sua própria trégua, não são os que mais saem perdendo?
Valencia: Tal risco sempre existe. Mas não se pode esquecer que as substituições no alto escalão das Farc ocorrem de forma muita mais rápida e fácil do que em um ministério do governo, por exemplo. Assim, o impacto na popularidade não é tão alto.
BBC Mundo: Se o governo realmente continuar a empreender ações defensivas ante os guerrilheiros em trégua, as negociações não podem sair prejudicadas?
Valencia: A trégua uniliteral significa o fim das ações ofensivas, e não de todas as ações das Farc. Ninguém vai ficar parado se eles atacarem. Eles (as Farc) vão reagir, vão se defender. É claro que alguns setores militares defenderão a ideia de aproveitar o momento para intensificar as ações contra o grupo. Essa é uma questão de extremamente complicada.
León Valencia é diretor da Corporación Nuevo Arco Iris (CNAI), um think tank sediado na Colômbia.

Comentários

VEJA AS DEZ POSTAGENS MAIS VISITADAS NOS ÚLTIMOS 7 (SETE), DIAS