Vamos Refletir! Religião: como abordar o tema nas escolas públicas sem ferir crenças?


Fonte: Twitter da Veiga de Almeida 


Ensino religioso está presente na historia do Brasil desde a época da colonizações, mas o assunto divide opiniões de professores, pais e alunos

A sabedoria popular diz que alguns assuntos não devem ser discutidos, e religião está nesse rol. Em um país com dimensões continentais como o Brasil, que não tem religião oficial e onde o sincretismo impera há séculos, abordar o tema nas salas de aula não é tarefa fácil. Muitos acreditam que a instituição de ensino não é o lugar mais apropriado para falar de Deus, justamente para respeitar a crença particular de cada criança e família, mas há quem defenda a prática, pois a disciplina seria importante para a formação dos alunos. Para a professora Ana Paula Miranda, do Departamento de Antropologia e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), o ensino religioso não é um problema, e sim a forma como ele é colocado em prática.
Professora Ana Paula Miranda UFF (Foto: divulgação)Professora Ana Paula Miranda, da UFF
(Foto: Divulgação)
“Trabalhei em uma escola que tinha ensino religioso, mas os pais de uma aluna eram budistas, e não queriam que a menina assistisse às aulas, que eram de cunho católico. A escola se recusou a dispensá-la da classe e eu comprei a briga da família. Na hora da aula, a criança ficava comigo. Com isso, angariei inimizades na instituição. Na minha opinião, a obrigatoriedade do ensino religioso está ligada a grupos políticos, que querem constituir princípios cristãos, o que fere a laicidade do Brasil”, ressalta.
A relação entre ensino religioso e escolas públicas remonta à época dos jesuítas, que fundaram em 1549 em Salvador o Colégio da Companhia de Jesus, a primeira de uma série de escolas públicas e gratuitas espalhadas pelo Brasil. Com o advento da República, definiu-se a separação entre Igreja e Estado. De lá para cá, o ensino religioso passou a ser considerado facultativo em todas as constituições e na Lei de Diretrizes e Bases (LDB).  Em 2009, o Congresso Nacional aprovou o Acordo Brasil-Santa Sé, assinado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2008, criando o novo dispositivo: “o ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação”. Para o professor Raimundo Nonato Coelho, coordenador da Pastoral da Educação na Arquidiocese do Rio de Janeiro, não existe privilégio para o ensino religioso católico.
Professor Raimundo Nonato Coelho (Foto: divulgação)Professor Raimundo Nonato Coelho
(Foto: Divulgação)
“A maioria da população brasileira ainda é católica, e isso se reflete na sala de aula. A escola só repercute o que acontece na sociedade. A lei diz que a educação deve ser integral e a dimensão religiosa faz parte da integralidade do ser humano”, defende.

Mas, o que pensam os próprios alunos sobre as aulas de religião? João Francisco Leão de Aquino Silveira, 17 anos, estudante do Colégio Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Cap-UFRJ), não concordo com o ensino religioso do jeito que é proposto. “Não tenho aula de religião e, se tivesse, eu não assistiria. Acho mais interessante um ensino mais cultural, que mostrasse a cultura brasileira em sua diversidade”, diz o aluno, que é ateu.

Já Allana Rodrigues Vieira, 16 anos, evangélica e aluna da Escola Técnica Oscar Tenório, no bairro de Marechal Hermes, Rio de Janeiro, acredita que o ensino religioso não é necessário. “Acho que as aulas de filosofia e sociologia já nos esclarecem sobre o assunto. O líder da igreja conversa bastante conosco a respeito do tema”, explica.
Larissa Santos Ferreira (Foto: divulgação)Larissa Santos Ferreira (Foto: divulgação)
Larissa Santos Ferreira, 16 anos, e também estudante da Escola Técnica Oscar Tenório, conta que já sofreu preconceito por ser mórmon. “As pessoas têm dificuldade para lidar com o que o é diferente, por isso acho que o ensino religioso poderia ajudar na medida em que aumenta o esclarecimento. Mas a religião não pode ser tratada de um ponto de vista só”, ressalta.

Raquel Cascais de Albuquerque, madrasta de Thalles Alves Carvalho dos Santos, 15 anos, aluno da Escola Municipal Rivadávio Correa, no Rio, conta que o enteado é candomblecista e não tem aulas de religião no colégio, mas que o tema é recorrente entre os alunos. “Entendemos que se falassem de todas as religiões, seria importante para diminuir o preconceito, mas acho que a escola não vai conseguir fazer isso, cada professor vai puxar para seu lado”, completa.

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