Primavera da arte: MG, SP e RJ iniciam temporada de exposições No rastro da Bienal, Brasil entra com força no calendário internacional no mês de setembro





Obra que o artista Nuno Ramos prepara para exposição da galeria Celma Albuquerque, em Belo Horizonte
Foto: Daniel Mansur / Divulgação
Obra que o artista Nuno Ramos prepara para exposição da galeria Celma Albuquerque, em Belo HorizonteDANIEL MANSUR / DIVULGAÇÃO
RIO - São quase 22h, e a repórter pergunta a Marcia Fortes, dona de uma das mais importantes galerias do país, a Fortes Vilaça, se é tarde para a entrevista, se ela prefere descansar para falar na manhã seguinte. Marcia ri:
— Descansar é uma palavra que só volta ao meu vocabulário depois de 18 de setembro. Vou te mandar minha agenda. Você vai ficar chocada.
A agenda da galerista não deixa dúvida: em setembro, o Brasil entra para o calendário internacional das artes plásticas. A Bienal de Arte de São Paulo, que abre no próximo sábado, puxa boa parte da programação do setor para este mês — e não só em São Paulo, mas também no Rio (que desde o ano passado sedia a feira ArtRio, no Píer Mauá) e em Minas Gerais (que programou a abertura de pavilhões de Tunga Lygia Pape em Inhotim e uma mostra de Nuno Ramos numa galeria de Belo Horizonte).
À agenda: neste sábado, a Fortes Vilaça abre quatro exposições (outras seis importantes galerias paulistanas também têm aberturas, entre elas o novíssimo espaço Roesler Hotel, da galeria Nara Roesler), e há a inauguração da retrospectiva de Lygia Clark no Itaú Cultural. No domingo, Marcia vai à casa de Milu Villela para o jantar de Adriana Varejão, artista que representa e que ganha retrospectiva no MAM a partir de segunda-feira. Ainda na segunda, vai ao jantar na casa do presidente da Bienal, Heitor Martins, e à festa da Art Basel com o diretor da feira, Marc Spiegler.
Na terça: preview da Bienal e abertura de “Para Todos”, mostra que substitui a tradicional Paralela, no Galpão do Liceu de Artes e Ofícios. Na quarta: abertura de exposição com curadoria do suíço Hans Ulrich Obrist na Casa de Vidro de Lina Bo Bardi e, depois, jantar da Bienal do Mercosul. Na quinta: viagem a Inhotim, para as inaugurações do pavilhão de Tunga. Na sexta: abertura de mostra de Nuno Ramos em Belo Horizonte. Na outra segunda, dia 10: viagem ao Rio para a abertura da grande instalação de Ernesto Neto na Estação Leopoldina (o mesmo dia em que abre, entre outras, mostra de Nelson Leirner na Silvia Cintra). Na terça, dia 11, ela abre para o preview o estande da Fortes Vilaça na ArtRio, que só desmonta dia 18.
Entre os que vão encarar a maratona, a lista de visitantes internacionais é longa. O MoMA de Nova York, por exemplo, manda ao país uma comissão liderada pelo diretor de programação internacional do museu, Jay Levenson. O Centre Pompidou estará representado pelo diretor, Alain Seban. O MoCA, de Miami, envia a diretora, Bonnie Clearwater. A venezuelana Ella Cisneros, dona de uma das mais importantes coleções da América Latina, também vai à Bienal — que tem curadoria de seu conterrâneo Luis Pérez-Oramas — e termina o périplo no Rio. Desembarca por aqui até a sheikha Hoor Al Qasimi, filha do governante de Sharjah, um dos sete emirados árabes. Ela vai apresentar em São Paulo, no dia 5, a programação da próxima Bienal de Sharjah, visita a Bienal e, no fim, a ArtRio. A feira carioca é marcada em função da Bienal.
— Esta sempre foi nossa intenção. O Brasil é muito longe para os estrangeiros virem e passarem pouco tempo — afirma Brenda Valansi, da ArtRio, que, no contato com as galerias, divulgava as “atrações”: Bienal e Inhotim.
Romaria às coleções privadas
O pacote oferecido surtiu efeito para a gigante Gagosian, que estreia numa feira brasileira. Outras galerias internacionais que estarão na ArtRio, como a Hauser & Wirth, que traz obras de artistas como Louise Bourgeois, vão aproveitar para visitar coleções privadas. Dono da galeria Lurixs, no Rio, Ricardo Rêgo vai receber em casa os diretores da Hauser, além de colecionadores de Zurique, o diretor da casa de leilão Phillips de Pury, Henry Allsopp, e um grupo organizado pela Associação Brasileira de Arte Contemporânea (Abact), que inclui curadores da Fundação Cartier, de Paris, e do New Museum, de NY.
— Costumo repetir (o colecionador) João Satamini: uma coleção só existe se é vista. Acho importante que vejam que existe um colecionismo comprometido no Brasil — afirma Rêgo, que, além de abrir exposição de Raul Mourão na sua galeria, dia 10, acompanhará o artista na mostra de grandes esculturas que será inaugurada dia 15 na Praça Tiradentes, na programação em torno da ArtRio.
Daniel Roesler, da galeria Nara Roesler, em São Paulo, lembra que o calendário de setembro ajuda a divulgar artistas brasileiros no exterior. Foi numa visita do MoMA à galeria na Bienal passada que Carlito Carvalhosa foi convidado a expor no museu de NY.
Nessa avalanche, destacam-se (além da Bienal e da ArtRio) as retrospectivas de Adriana Varejão e Lygia Clark (1920-1988), ambas em São Paulo, e o pavilhão de Tunga em Inhotim. A importância de “Lygia Clark: uma retrospectiva”, que abre hoje no Itaú Cultural, vai além do monumental conjunto de 150 obras. A seleção dos curadores Felipe Scovino e Paulo Sergio Duarte dá conta de toda a trajetória da mineira radicada no Rio. Para Alessandra Clark, neta de Lygia, trata-se da primeira mostra fiel às propostas de vivência da artista. A participação do público está na raiz do seu trabalho, em instalações como “Campo de Minas”, onde as pessoas caminham sobre uma superfície imantada com sapatos magnetizados. A curadoria teve acesso aos diários da artista e realizou duas instalações idealizadas numa época em que, por limitações tecnológicas, seriam impossíveis: “Filme sensorial”, um cinema feito de som e luz em sincronia, sem película; e “O homem no centro do mundo”, em que o visitante entra num cubo onde são projetadas imagens captadas por um caminhante anônimo, munido de capacete com câmeras digitais.
Tunga: 20 obras em 2,6 mil metros quadrados
Já no MAM paulista, bem ao fundo do espaço expositivo, o visitante de “Histórias às margens” — que vem em janeiro para o MAM do Rio — vê um círculo vermelho, sem distinguir detalhes. Conforme avança pela sala, entre divisórias com mais de 40 pinturas da carioca Adriana Varejão, verá que também é observado. O ponto vermelho é, na verdade, um prato de grandes proporções, referência ao trabalho do ceramista português Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905), foco atual da pesquisa da artista. No centro, salpicado de arabescos dourados, está um autorretrato de Adriana, criado para a mostra. Trata-se da primeira exposição panorâmica dos 21 anos de trabalho da pintora cuja obra explora os ecos do barroco e da miscigenação fundadora do Brasil.
Em Inhotim, Minas Gerais, Tunga prepara há duas semanas o pavilhão que levará seu nome, com mais de 20 obras distribuídas por 2.600 metros quadrados. Trabalhos que já pertenciam à coleção de Bernardo Paz, como “Lézart” (1989), vão conviver com outros, como “Lumière de deux mondes” (2005), instalação feita originalmente para o Louvre, em Paris. Tunga, que participou do projeto arquitetônico do escritório Ryzoma, diz que se colocou como se fosse construir uma casa:
— Decidi que o centro seria como um acelerador de partículas, com salas contínuas no entorno, sem paredes, para que a obras tivessem conectividade.
Perto dali, o cubano Carlos Garaicoa organiza as mais de 200 velas de sua instalação “Now let’s play to disappear II” (2002) no estábulo da antiga fazenda que hoje abriga o maior centro de arte contemporânea do país. Na mata, a espanhola Cristina Iglesias já previu as árvores que serão plantadas ao redor do seu labirinto espelhado “Vegetation room Inhotim” (2010-2012). Tudo será inaugurado na quinta-feira, para aproveitar, como diz o diretor artístico do instituto, Jochen Volz ,“o movimento único de setembro”. O evento inclui ainda a abertura do pavilhão de Lygia Pape, que abriga “Tteia” (2002), obra-síntese da trajetória da artista.
O GLOBO

 

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