Festival de pipa salvou a vida de jovem na Chatuba Conheça as histórias de 2 jovens que quase tiveram o mesmo destino dos 6 amigos


Os seis adolescentes assassinados na chacina na Baixada poderiam ter sido nove. Três outros jovens, por diversos motivos, desistiram de ir à cachoeira do Parque do Gericinó. O Jornal do Brasil conversou com dois destes rapazes. Eles contam, com exclusividade, o que os fez escapar da tragédia que atingiu seus amigos e abalou o Rio de Janeiro.
Um deles, identificado como jovem X, estudante de 16 anos, conta que a maioria dos jovens moravam muito próximos uns dos outros. Seu gosto por soltar pipa o salvou da tragédia:
Terreno nos fundos da casa de Cildes já sai no Parque de Gericinó
Terreno nos fundos da casa de Cildes já sai no Parque de Gericinó
" Eles estavam aqui em frente à minha casa, combinando de ir para a cachoeira. Eu falei que ia. Só que eles demoraram muito e eu fui sozinho para o festival de pipa que acontecia no parque. Eles voltaram a passar no festival, me chamaram de novo, e eu preferi ficar nas pipas", lembra o jovem, até hoje aliviado.
Segundo ele, os amigos sempre marcavam de ir à cachoeira, foram algumas vezes e nunca tinham tido problemas.
X se emociona ao lembrar o momento em que soube o que havia acontecido com os amigos. E faz uma constatação sobre os traficantes que tiraram a vida dos jovens que, até a sexta-feira (7), faziam parte de sua vida. "Esses caras não têm coração".
O outro jovem, identificado como Y, de 20 anos, diz que se preocupou com o horário em que os seis decidiram ir para a cachoeira: 
"Eles saíram daqui lá por umas 15h, 15h30. Daqui até a cachoeira gasta-se uma hora, uma hora e meia de caminhada. Achei que era muito tarde", conta ele.
Responsabilidades de pai de família também levaram Y a não acompanhá-los à cachoeira: "Fui com a minha esposa comprar comida para a nossa filha. Quando voltei, já tinha um alvoroço na rua por conta do sumiço deles", relatou o jovem. 
Ele não sabe dizer se havia um funk proibido tocando no celular de um dos jovens no momento em que eles foram abordados pelos traficantes. "Música eles sempre ouviam, mas não sei se tinha o funk " proibidão" no celular deles", disse, referindo-se ao possível motivo que teria levado os traficantes a assassinarem os jovens, por se tratar de um funk da facção rival.
Um terceiro jovem chegou a acompanhar o grupo que se dirigia à Cachoeira do Gericinó, mas estava com o pé machucado e decidiu voltar para casa por causa disso. Mal sabia ele que estava nascendo de novo. O jovem foi proibido pelo pai de testemunhar sobre o caso na 53 DP e não foi encontrado pela reportagem do Jornal do Brasil.
" Nós ligávamos pro celular dele e ninguém atendia"
A mãe do jovem Y contou que Cristian Vieira, um dos seis assassinados, esteve na casa dela no dia da chacina: sábado, 8 de setembro. Ela, ainda se emociona ao lembrar o encontro e se arrepende de não ter impedido o passeio do rapaz:
"Cristian me chamava de mãe, né? Era muito amigo de meu filho. Não sabia que ele iria para a cachoeira. Se soubesse, jamais o deixaria ir até lá. Uma pessoa acabara de dizer que alguém já havia sido assassinado ali, naquele mesmo dia", contou ela, referindo-se ao pastor Alexandro Lima, de 37 anos, morto na manhã daquele sábado.
A mãe de Y conta também que a namorada de Cristian esteve com ela na tarde em que os jovens desapareceram e fez uma revelação assustadora : "A namorada me contou que o celular do Cristian estava atendendo, mas havia só um ruído, ninguém respondia. No  mesmo dia ela se encontrou, por volta das 20h, com o pai de Cristian, Cildes Vieira, que não sabia que o filho tinha ido à cachoeira. Os dois tentaram um contato com o rapaz. Ligaram uma vez, nada. Outra vez, nada. Na terceira, ouviram: 'Quem tiver do outro lado da linha pode fazer um outro filho. Esse aqui já era'", lembrou a mãe de Y.
Exército com medo dos traficantes
Cildes Vieira, pai de Cristian Vieira, um dos seis jovens assassinados na chacina, lembrou de sua peregrinação por delegacias assim que soube do desaparecimento do filho: " Fui à 57 DP(Nilópolis), à 53 DP(Mesquita), à 31 DP(Ricardo de Albuquerque) e finalmente à Vila Militar, em Deodoro. Perguntei sobre o patrulhamento do Exército no Parque do Gericinó, uma vez que aquela é uma área militar, e se haviam prendido alguém", recorda Vieira. A resposta que ouviu de um oficial foi, segundo ele, inacreditável:
Cildes Vieira, pai de Christian Vieira, morto na Chacina, declarou que processará o governo do Estado
Cildes Vieira, pai de Christian Vieira, morto na Chacina, declarou que processará o governo do Estado
"Eles disseram que fizeram a patrulha até a altura do Festival de Pipa, mas que não tinham ordem de prender ninguém. Eu contei que havia seis jovens desaparecidos, inclusive o meu filho. Foi aí que o oficial disse que recebera ordens de não atravessar a guarita depois do evento de pipa, porque ali era área de traficantes. É um absurdo!", contou, com indignação. 
Os fundos da casa de Cildes desembocam em uma das áreas do Parque do Gericinó. O local ao que o Jornal do Brasil teve acesso é completamente abandonado e não possui nenhuma espécie de patrulhamento do Exército.
Cildes adiantou que entrará em contato com advogados para processar a União e o Governo do Estado do Rio de Janeiro. Para ele, estes são os responsáveis pela morte de seu filho, Cristian, e dos outros cinco jovens na cachoeira do Parque do Gericinó:
"Vou entrar com um processo contra eles. São os órgãos competentes para cuidar da segurança e nos deixam à mercê de muita coisa ruim."
O pai de Cristian garante que o receio de represálias existe. Porém, o que o move é algo muito maior:
" A vontade de fazer justiça é muito maior do que o medo. Se depender de mim, essa história não vai ficar impune. Não vou deixar que meu filho morra em vão", concluiu Cildes, com lágrimas nos olhos.

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