Compra de votos: Barbosa vai condenar réus do PTB e do antigo PL, Joaquim Barbosa analisa o item 6 da denúncia, e trata sobre os crimes de corrupção passiva e lavagem





Ministro relator do julgamento do mensalão, Joaquim Barbosa
Foto: Agência O Globo / Ailton de Freitas
Ministro relator do julgamento do mensalão, Joaquim BarbosaAGÊNCIA O GLOBO / AILTON DE FREITAS
RIO - Ao retomar nesta quarta-feira a leitura de seu voto sobre o item 6 do processo do mensalão - que trata sobre a compra de votos de parlamentares – o relator Joaquim Barbosa indicou que votará pela condenação dos réus do antigo PL (hoje PR) e do PTB por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Reiterando diversas vezes que houve compra de apoio político, Barbosa vai contra a tese do PT de que o dinheiro do valerioduto seria usado para financiamento de campanha, por meio de caixa 2.

Roberto Jeffeson, o primeiro a denunciar o esquema, em 2005, embolsou R$ 4 milhões do grupo criminoso. Para Barbosa, assim como para a PGR, o comportamento caracteriza corrupção passiva:Valdemar Costa Neto, Jacinto Lamas e Bispo Rodrigues, ligados ao antigo PL, devem ser condenados pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Além de Romeu Queiroz, Roberto Jefferson (PTB) e Émerson Palmieri por corrupção passiva. Barbosa expôs claramente que concorda com a acusação da Procuradoria Geral da República. Ele afirma que verificou ainda a existência de uma organização criminosa voltada para a prática de crimes, formada por Valedemar Costa Neto, Jacinto Lamas e José Carlos Batista. Antônio Lamas, outro corréu no processo, deve ser absolvido por falta de provas, como pediu a PGR.
- Mesmo que, como alega a defesa, o senhor Roberto Jefferson não tivesse aderido à pratica periódica dos pagamentos, ainda assim o crime de corrupção passiva estaria caracterizado - disse Barbosa.
Segundo o ministro, o repasse de quantias milionárias aos parlamentares do antigo PL foi feito por interlocução do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, que indicou os nomes dos beneficiários a Marcos Valério: Costa Neto, então líder do PL, e Bispo Rodrigues, que coordenava bancada evangélica. Barbosa argumentou que os pagamentos foram quase sempre superiores a R$ 100 mil, em espécie, sem qualquer observância das normas bancárias e dos normativos do Banco do Brasil. Em troca, esses réus concederam o apoio deles e dos parlamentares por eles orientados aos interesses dos corruptores.
- O réu Marcos Valério confirmou ter efetuado repasses a esses parlamentares, alegando que se tratou apenas de ajuda de campanha. Disse "foi apresentado a Valdemar Costa Neto por Delúbio Soares. Não possuía qualquer relação com ele (...). As transferências ao PL do Rio de Janeiro somam R$ 400 mil. O PL nacional recebeu a quantia de R$ 10 milhões. (...). Não conhece Bispo Rodrigues e o repasse feito a ele foi determinado por Delúbio Soares” – lembrou o relator.
Todos os pagamentos reforçam a conclusão de que o dinheiro recebido atraiu correligionários aos partidos, cujos líderes permitiram o apoio majoritário ao governo (...)
- Ao contrário do que alega a defesa (de Valdemar Costa Neto), houve sim demonstração de pagamento de valores em seu benefício durante o período de dois anos e houve concentração de pagamentos no período de reformas importantes – revelou Barbosa. - Nota-se que os deputados tinham poder de não apoiar o governo e, para evitar isso, foram distribuídas vultosas quantias em dinheiro.
De acordo com a defesa, como o acordo financeiro foi realizado durante a campanha de 2002, não dizia respeito ao exercício do mandato. Mas o relator refutou a tese e citou documentos enviados pela Câmara para desmontar os argumentos dos réus:
- O que ocorreu foi bem diverso do que se alega. O acusado Valdemar Costa Neto recebeu pessoalmente pagamentos milionários, em espécie, ao longo de 2003 e 2004, quando em pleno andamento a legislatura. Os pagamentos foram feitos por intermédio da estrutura empresarial de Marcos Valério - apontou o relator, que também citou documento da CPI:
- O relatório final verificou ainda: "em cinco meses amealharam cerca de R$ 500 mil. Nesse período, ocorreram votações importantes no Congresso Nacional, a exemplo da reforma da previdência, tributária e das PECs paralelas". Todos esses números reforçam a conclusão de que o dinheiro recebido atraiu correligionários aos partidos, cujos líderes permitiram o apoio majoritário ao governo.
Barbosa destacou também que o acerto prévio não afasta a prática de crime:
- Ao contrário, a prática do crime de corrupção passiva pode se dar antes de o acusado assumir a função, desde que a vantagem indevida seja dada devido a essa função – opina o relator.
No caso de Jacinto Lamas, ex-tesoureiro do partido, Barbosa afirmou que, ainda que seu envolvimento não seja idêntico ao do parlamentar, “tendo em vista a ascendência funcional”, sua participação foi relevante para a prática criminosa:
- O exercício do mandato foi fundamentalmente influenciado pelos recursos recebidos em espécie, que permitiu seu livre uso pelos acusados – lembrou Barbosa. - Na ocasião, o ex-tesoureiro do PL admitiu ter ficado conhecido na agência do Banco Rural em Brasília, tamanha era a frequência dos pagamentos que recebeu em favor do parlamentar.
Quanto ao Bispo Rodrigues, o relator lembrou a afirmação de Marcos Valério, de que o parlamentar foi indicado pelo próprio Delúbio Soares, e recebeu R$ 400 mil, no total. Segundo o relator, Bispo Rodrigues apoiou a chapa proposta por seu partido - como ele mesmo afirmou e, portanto, não havia por que o PT decidir pagar gastos do parlamentar com campanha eleitoral. Ao tentar explicar a quem pagou as despesas, Rodrigues incorreu em diversas contradições:
- Por ser corrupção passiva delito formal, a eventual destinação dada pelo Bispo Rodrigues aos recursos não descaracteriza o caráter criminoso da sua conduta porque o acusado concedeu seu apoio a projetos do governo de acordo com dinheiro recebido de seu partido e de Valdemar Costa Neto – disse o relator. - Percebe-se que Bispo Rodrigues recebeu dinheiro do PT porque era um dos líderes do PL, além de seu inegável poder de influência aos demais parlamentares de seu partido.
Lavagem de dinheiro em pauta
Com relação ao crime de lavagem de dinheiro, Joaquim Barbosa elencou uma série de pagamentos feitos a Valdemar Costa Neto, e afirmou que os recursos eram depositados pelos réus da SMP&B, mediante cheque da empresa, na conta da corretora Guaranhus e essa retirava um percentual pelo serviço de lavagem de dinheiro prestado e repassava o restante para o réu Valdemar Costa Neto. O montante chegou a R$ 5 milhões em agosto de 2002.
- Os réus queriam simular um negócio privado entre a SMP&B e a Guaranhus para ocultar o beneficiário do dinheiro, que era Valdemar Costa Neto. (...) Não há qualquer ato que formalize o suposto empréstimo, um montante milionário indicado pelo acusado – argumentou o relator. - O réu não conseguiu justificar o motivo de ter tomado um empréstimo bancário com uma corretora e não com uma instituição bancária, a juros de mercado. E também não explicou por que tomou um empréstimo em seu nome e não em nome do partido, já que a justificativa era pagamento de despesas de campanhas.
Barbosa assinalou que todos esses recursos foram pagos a Valdemar Costa Neto pela estrutura empresarial de Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, por orientação de Delúbio. Segundo o relator, a estrutura empresarial do publicitário também foi utilizada para ocultar o real pagador do dinheiro - o Partido dos Trabalhadores:
- O parlamentar, assim, valeu-se de dezenas de mecanismos de lavagem para garantir o recebimento da vantagem indevida, em espécie, sem deixar qualquer vestígio ou rastro no sistema bancário. Trata-se de grave interferência no exercício da função de parlamentar.
O relator disse ainda que o então deputado Bispo Rodrigues sabia que a origem do dinheiro era ilegal. E que, portanto, também estava participando do crime de lavagem de dinheiro.
- A fim de não deixar qualquer rastro de sua participação, o réu bispo Rodrigues pediu a uma pessoa de sua confiança - o motorista do partido - que fosse ao banco receber os recursos. Bispo Rodrigues sabia que os recursos tinham origens criminosas, dentre os quais o de corrupção passiva praticada por ele mesmo - disse Barbosa que, mais adiante, concluiu:
- A conduta do Bispo Rodrigues preenche o tipo penal previsto no artigo 1º da lei 9.613 (...) na medida em que participou da movimentação de valores provenientes dos crimes analisados nesses autos. Assim, o Bispo Rodrigues também praticou o crime de lavagem.
Jefferson recebeu para votar com o governo
Ao falar sobre a compra de apoio político denunciada pela PGR em relação ao PTB, Barbosa disse que documentos apreendidos e depoimentos colhidos revelam que os acusados receberam mais de R$ 5 milhões do PT no curso das atividades legislativas de 2003 e 2004. Para o relator , José Carlos Martinez (morto), Roberto Jefferson e Romeu Queiroz receberam vantagem indevida.
- A direção do PT chegou a negociar em 2004 o pagamento de 20 milhões ao PTB. O fato foi anunciado aos parlamentares do partido. Isso também evidencia que os repasses e promessas de pagamentos realizadas pelo PT exerceram forte influência sobre a fidelidade dos deputados federais do PTB nas votações na Câmara - disse o relator.
Roberto Jeffeson, o primeiro a denunciar o esquema publicamente, não teve seus argumentos de defesa aceitos pelo relator. Segundo ele, mesmo não recebendo regularmente os pagamentos, Jeffersou embolsou R$ 4 milhões.
- Mesmo que, como alega a defesa, o senhor Roberto Jefferson não tivesse aderido à pratica periódica dos pagamentos, ainda assim o crime de corrupção passiva estaria caracterizado. É que o acusado recebeu nada menos que R$ 4 milhões do Partido dos Trabalhadores. E como ele mesmo alega, ‘houve distribuição a pessoas’, cujos nomes ele se recusou a revelar. Pagamentos como esse equivalem, sem dúvida, a prática corrupta.
Barbosa diz que o próprio Jefferson “aceitou recursos do PT para apoiar o partido”.
- Diz Roberto Jefferson que ‘o PT inaugurou na legislatura a prática mais viciada de política que há. Na Câmara dos Deputados foi a primeira vez que eu vi. Nunca tinha visto transferência de dinheiro para comprometer o deputado com o a base do governo,. A conversa era de quinta categoria’.
O relator ainda afirma que vai condenar os réus por corrupção passiva:
- As provas demonstram que Émerson Palmieri auxiliou tanto Jefferson quanto Queiroz, participando da prática de corrupção passiva. Palmieri exerceu a função de orientar e receber os recursos que estes intermediários levavam até as dependências dos partidos.
STF segue votação sobre compra de votos
Os ministros do STF retomaram nesta quarta-feira o julgamento do processo do mensalão com a continuação da leitura do voto do relator, ministro Joaquim Barbosa, sobre o item 6 da denúncia apresentada pelo Ministério Público. Na segunda-feira, primeiro dia do julgamento do núcleo político do esquema, Barbosa analisou os saques em espécie feitos por deputados e assessores de políticos e de partidos na boca do caixa do Banco Rural. Ele começou seu voto relacionando os saques dos valores com as votações ocorridas no Congresso Nacional, e terminou sustentando a existência das práticas de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha por parte da cúpula do PP e de Marcos Valério e Delúbio Soares.
Joaquim Barbosa falou somente sobre o primeiro subitem, e, apesar das indicações, n ão proferir ainda nenhum voto sobre os réus. Nesta quarta, ele deve dar continuidade aos outros subitens, referentes aos outros partidos envolvidos na ação: PTB e PMDB e PR (ex-PL).
Os dez réus do mensalão que ainda não foram julgados por corrupção passiva devem ser condenados, a exemplo dos outros dois que respondiam pelo mesmo crime. Isso porque a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) defende que, para comprovar o crime, basta que o acusado tenha recebido vantagem indevida para realizar ato de ofício, ou seja, ter poderes para tomar uma providência em favor do corruptor. O ato não precisa necessariamente ter ocorrido.

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